MÚSICA | Entrevista com Caião Relíquia


Esse primeiro moço da foto se chama Caião Relíquia, um guitarrista carioca que a mais de dez anos está na cena musical, e desde 2018 vem lançando singles de seu onônimo projeto solo. Fazendo um math rock instrumental e original, Caião lança neste dia 26 de julho seu primeiro EP intitulado Trem Clandestino à Gramacho. Nesta entrevista conversamos sobre sua carreira, esse novo trabalho, que já ouvi previamente, e ainda conferimos uma faixa em primeira mão.


Como você se apresenta pra quem não te conhece como artista?

Sou um guitarrista que faz música estranha na esperança que pessoas estranhas escutem.

Bicho, curti o EP. Pelos singles anteriores esperava mais aqueles... Não sei o nome, é brekdown mesmo? Aquelas paradinha que math rock tem. E não teve muito, foi bem suave, mas n fez falta, tá  top. Da tanto pra ouvir dormindo, quanto no ônibus, de bike, a pé, trabalhando, estudando e até fazeno nada. Tu manda muito bem, tá show.

Poxa! Que bom que você curtiu! Esse EP ele acabou trazendo muito mais da linguagem latina do Math Rock. Eu tava ouvindo muito umas bandas daqui da america do sul, aí surrupiei coisas dali, e de algumas coisas regionais aqui do Brasil também. 

Eu não manjo nada de math rock. O que é? E qual a diferença do latino paro que é feito em outros lugares?

Eu falo pra galera que tem aí uns 4 tipos de math rock, saca? Sulamericano, Asiático, Europeu e Norte Americano. O Sulamericano é mais próximo do post rock que os demais, e ele é bem mais focado em melodias e ambiências. É um tanto menos técnico que os outros também, é mais feeling, rolam instrumentos não tão comuns ao estilo como sopros e percussões harmonicas, tipo xilofone, e tem muita influência dos ritmos latinos. É muito comum tu achar um groove de salsa, ou uma marcha de tango, não tão escancarados, mas colocados lá de modo estrutural, pra "temperar" a coisa.

Bem, então puxando disso que tu explicou do math rock, como tu pensou essa parte regional BR pro EP?

Cara, pra mim é muito natural pensar em alguma regional, principalmente nos grooves, porque eu gosto muito, e estudei bastante disso quando estudava guitarra. Eu tenho um livrinho aqui com cento e poucas melodias de frevo e coisas do tipo, então sempre que posso tento meter um baião, um axé, algo assim em algum som meu.

Tem algo que você pôs além do math rock e dos rítimos regionais que dá pra sacar no som?

Eu sempre pego emprestado um caco do jazz, um caco do post rock, e até da música pop mesmo. Adoro deixar a música estruturadinha e talz. Sempre tento encaixar essas coisas de maneira discreta. Aliás, nesse EP tem um discreto groove de batidão de funk, e uns easter eggs também.

Tem algo que você descartou ou pensou em por mas não conseguiu?

Quando eu tento fazer algo que seja essencialmente baseado só no math rock, quando tento forçar odd times, quando tento forçar alguma ousadia na harmonia, tudo que eu tento colocar como algo puramente pensado acaba tendo que ser ou enxugado, ou descartado. Num geral a música quando vem pra minha cabeça já vem 90% pronta com todas as possíveis entradas.

Quais foram as maiores dificuldades na produção do EP?

Cara, te falar que não teve muitas dificuldades não. Foi mais acertar a minha agenda com o Beto lá no estudio pra fazer as guitarras. Porque o todo resto foi bem fácil.

E como foi a experiência no todo? De ir gravar, dar pausas, esperar...

O processo foi bem divertido, a gente gravou o material relativamente rápido.
Victor fez a batera toda num dia, leandro e eu gravamos em dois dias cada. E como eram músicas que a gente tocava há bastante tempo, a gente já tava bem acostumado. No fim foi tudo muito divertido e proveitoso.

E como foi o processo de produção da capa?

A capa eu chamei o meu amigo Leonardo Jesus pra fazer. Tirando a "micro_tédio" e a "Laços Unilaterais", ele trabalhou em todas as artes minhas. Essa foi bem legal porque eu queria brincar mais com essa estética vaporwave/retrowave/citypop e o Léo sintetizou bem tudo isso.

Bem mesmo, ficou muito boa. O que mais amei no EP foram os títulos. Como é esse processo de composição, temas e tal?

Os títulos eles acontecem de diversas formas, as vezes é uma coisa que eu ouço alguém falar, é alguma situação, é alguma coisa que eu ouvi errado, causos de amigos, ou até mesmo sentimentos e conflitos meus. Nesse EP tem um misto de tudo isso, sabe?
Tem a "Não Criei Filho Ninja" que é uma história do Ricardo (da Marsara), que ele certa vez contou aqui em casa. Eu ri tanto que quando eu peguei a guitarra pra tocar, eu só pensava nisso e na melodia do tema.
"A Crush do Transporte Coletivo" foi um Crush real que eu tive numa mina num transporte público. Num momento que eu tava tendo a inspiração pra uma melodia da música e etc...
Eu geralmente componho meio que psicografando, sabe? Pq quase sempre a música já é feita completa, com arranjo, com ideias e entradas acertadas. Raratmente eu tenho que mexer em alguma ideia.



Ai que legal! Como foi o "Banheira do Goo Goo?

Essa foi pq eu tava almoçando e ouvi de orelhada que ia ter um quadro especial no programa do Gugu celebrando 20 anos da banheira do Gugu, algo assim. Aí eu peguei e montei a minha música usando, basicamente, a mesma harmonia da música da banheira do Gugu. Você consegue cantar tranquilamente em cima da minha o "bubba, bubba, bubba, hey!".

Por que gravar um EP?

Eu particularmente gosto muito de album, mas os hábitos mudaram, né? Eu tô beirando os 30, meus hábitos de música já são diferentes dos mais velhos, e são diferentes (ainda mais) se comparado a galera que consome hoje. Antigamente a gente sentava na sala e ouvia o CD ou a fita e etc... Hoje a gente ouve tudo no celular, no onibus, no uber e etc. E as pessoas não ouvem o mesmo material por muito tempo. Então dificilmente eu vou conseguir segurar um ouvinte que tá ouvindo meu som enquanto tá, sei lá, indo trabalhar, por 40 minutos. Em 40 minutos ele quer ouvir o máximo de artistas que ele gosta e não só um, sabe? Isso não é um lamento não, eu acho que o artista tem que se posicionar de acordo com a realidade do mercado. E a nossa é essa. Então eu pretendo investir mais nos EPs e Singles. Um album pode demorar um pouquinho mais.

E por que fazer música instrumental? Como tu vê o cenário instrumental por aí, e por que chamar assim, se é apenas música sem vocal?

Eu faço música instrumental porque eu não sou cantor nem bom letrista. Sou um cara que tem muita vergonha da própria voz e do que escreve. Fora que eu já toquei e trabalho com diversos cantores por aí. É uma limitação? É! Mas pelo lado positivo, isso me proporcionou mais intimidade com meu instrumento. Eu sinto que eu "falo" muito melhor através da guitarra.
Essa separação de música instrumental da música cantada, na minha cabeça ainda fica mais dividida quando eu comparo meu som com o que é chamado de música instrumental aqui. No Brasil, música instrumental tá ligada diretamente com venda de aulas pra escolas de música, workshops e songbooks. Não tem nada de errado nisso, os caras tocam pra caralho, tem uma carreira educacional extensa também. Mas eu sinto que eu não pertenço a essa célula, sabe? Pra mim o som que eu faço é ainda um pouco mais 'b' que essa vibe virtuose, mas, ao meu ver é um público que tem interesses diferentes. Nem todo mundo que vai a show meu é músico, eu sinto que eu consigo botar meu som numa playlist de um cara que ouve música "normal". Não necessariamente um cara que quer aprender meus "licks".

O que te inspira a fazer arte?

Eu tenho muito medo de morrer. A morte é uma coisa que dá um ponto final e acabou. Eu entendo que fazer arte é uma forma que eu vou ter de continuar vivo por aí, saca? Ainda que com um alcance restrito, eu sinto que uma ou outra pessoa eventualmente falará de mim, e do que eu fiz um dia. Por isso eu sempre faço todo tipo de som possível, sempre que possível. O quanto mais eu puder viver através da arte (E por que não dela também, né? Manda jobs gente) melhor. Arte é vida, e viver engloba tudo. Comunicação, relacionamento, troca de experiências e etc. Então fazer arte, pra mim, é tão inspirador quanto viver e talz.

O que você tem ouvido?

Pô, eu tenho escutado muito o Elephant Gym, o disco deles mais recente, o Underwater é coisa fina demais. Tenho escutado bastante também o E a terra nunca me pareceu tão distante, Covet recentemente lançou um EP acústico lindo e o American Idiot do Green Day que é um dos discos de cabeceira.

Alguma dica pra quem tá começando?

Cara, a minha dica é sempre curtir ao máximo até se profissionalizar. Quando se profissionalizar, contrate alguém pra ser profissional enquanto vocês curtem. A gente faz arte por prazer, e isso precisa ser o foco. Se a gente não gosta do que faz, nada sai direito. É algo nessa linha aí.

O que você faz quando não está fazendo nada?

Geralmente eu ouço música ou toco guitarra. Assisto uns Kamen Rider também.

E por ultimo mas não menos importante, qual seu lanche favorito?

Morte Lenta aqui do Gramacho ❤

O que é isso?

É uma lanchonete aqui da area. Um podrão de bairro que vende um dogão sinistro ou um x tudo nervoso e radioativo.


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