MÚSICA | Você disse… IDOL? Sim, porém não muito.



CALMA, eu explico. E pra explicar vou fazer um tour pela minha adolescência, o que não tem nada de mais na verdade, mas vai dar um panorama por onde o alternative idol pode pegar cada um. Não vou começar falando pelo IDOL, mas sim dos auges do emocore dos anos 2000 quando a internet era escassa e andávamos entre baixar músicas extremamente desconhecidas daquela bandinha que ninguém conhecia a 32 kpbs no limewire e entre o que a MTV passava nos seus clipes diários, e como sou do interior do Paraná e não tínhamos MTV, nosso atraso era de uns meses. Contudo caminhar entre o pop da MTV e as bandas bizarras que acabava descobrindo (alô Frankenstein Drag Queens) me fizeram procurar coisas de todos os tipos de coisas estranhas e experimentos que podia encontrar na música, mesmo que não pudesse dividir com ninguém, porque né.

Nessas idas e vindas entrei em contato com o noise japonês lá por 2010/11 com as bandas conhecidas no meio como Melt Banana e Hijokaidan e The Locust, que já tinham um certo tempo de estrada no meio. E nesse ponto você se pergunta: tá, mas onde o IDOL japonês entra nesse bolo? E aí que começa, descobri o BiS (Brand-new Idol Society) porque por algum motivo caí nesse vídeo delas junto com o Hijokaidan:





Nesse post aqui do Magdiel, ele explica como funciona o IDOL e onde o BIS entrou nisso lá no Japão, na contracultura. Pois bem, o IDOL tem todo o funcionamento que uma boa organização japonesa se orgulha: hierarquia, garotas extremamente novas, coreografias, processos seletivos, padrões estéticos, e tudo o que envolva uma aura de inocência e intocabilidade. O foco aqui não é apresentar o IDOL no Japão e destrinchá-lo numa análise antropológica de como tudo isso funciona no ocidente, estou aqui pra falar justamente do que se propôs a desvirtuar isso.

Uma dica para compreender melhor esse mundo IDOL está no documentário Tokyo Idols que tem na famigerada Netflix:





Pour Lui e o Brand-new Idol Society



Para entender a dimensão do idol não é difícil, no ocidente é o pop, lá é o idol, ponto. E dito isso, tanto lá como aqui algum artista que não queira adentrar nesse mundo pode-se considerar resistência, pois você tem uma mídia e uma atenção voltada somente a uma representação de música, estilo e afins. E nesse meio que cultural que surge a figura da Pour Lui (lê-se em francês), que começou a carreira solo em 2009 e logo sentiu o peso do idol no Japão, lançou singles e um álbum intitulado "Minna no Pour Lui" produzido por um cara chamado Watanabe Junnosuke (que volta na história em outro momento), mas em 2010 decide formar um grupo idol, parte decidida a causar problemas para Watanabe, parte pois também gostava de alguns grupos idol como Morning Musume. 

Pois bem, encerrada a carreira solo, com audições feitas para um novo grupo (este nome de audições acho graça, porém parece ser algo comum lá, pois ser idol é o sonho de várias garotas) em 2011 o primeiro álbum foi lançado e a partir daí começa a crescer o anti idol, underground idol ou qualquer coisa com idol que você queira chamar. O importante aqui é: não entendo nada de japonês, até algum tempo atrás não entendia praticamente nada da maioria da letras, contudo quando você entre em contato com esse movimento, de cara você percebe que tem algo ali que não se está acostumado a ver, mesmo para nossa visão ocidental do ponto. O idol tem uma intocabilidade como um falei acima, o propósito do BiS é justamente o oposto, são "idols que você pode tocar" slogans do próprio BiS.

Ele é nascido de um desejo de expressar o idol de outro jeito, de expor outras coisas, e quando aproximaram fisicamente o idol, subvertendo o próprio gênero, criaram algo que vai desconstruindo passo a passo o que entende-se por idol. 

Você quer provas? Você quer vídeos? Eu te dou:




O vídeo da música My Ixxx por exemplo, filmado na floresta de Aokigahara com as integrantes aparentando estarem correndo nuas por lá, com uma estética e visão que claramente o ocidente não saberia ter (vide Logan Paul). E lançamento após lançamento, mudando sua estética, com ironias sobre práticas realizadas pelos grupos idol (como incentivar fãs a comprarem muitos singles - sim os singles físicos ainda imperam por lá), temas sem medo de abordar a sexualidade, shows intensos sem o roteiro seguido pelo idol tradicional, lançamento de vídeos fofos com b-sides pesadas, entre outras, o BiS foi sendo notado e em 2012 o BiS assinou com a Avex, se você conhece o idol no Japão sabe quem a Avex é, ou pelo menos já passou por seu youtube.
Aí em 2012 surge o álbum IDOL is DEAD que além deste título bem direto, tem a história de elas proporem CORRER 100 KM (que nenhuma chegou até o fim) que virou uma divulgação para o vídeo da música Hitoribochi. E é nesse ano que se juntam ao Hijokaidan e formam o BiS Kaidan e que conheço a banda e que o BiS mostra por onde a contracultura tem que andar, digo isso porque o BiS assinando com a Avex poderia muito bem ter se mantido em seus clipes, musicas e shows, mas elas vão em um ambiente completamente oposto, se misturam com o noise e abraçam isso, caminham entre vários estilos sem medo (quantas vezes você viu por aqui alguém dito da "contracultura" abraçar o bizarro, o oposto? Eu conheço poucos, pouquíssimos).




Em 2014 o grupo lança o álbum WHO KILLED IDOL? contudo, como todo grupo idol, vários membros passaram, e nesses idas e vindas Pour Lui também ia ensaiando sua saída, e em 2014 o BiS acaba com cada membro dando seguimento a sua carreira e sua vida, e o que fica do BiS naquele momento é justamente o legado. O BiS se reuniu novamente em 2016 contudo o "estrago" já havia sido feito. Quando digo estrago aqui é na melhor definição possível. Depois do que o BiS fez, o caminho para este idol alternativo foi aberto e ninguém mais fechou. Watanabe continuou parte dessa história com o BiSH (Brand-new idol SHiT) em 2015, outras bandas foram formadas como o Billie Idle, PASSCODE, Gang Parade, Maison Book Girl, NECRONOMIDOL, muitas delas sobre a tutela de Watanabe como produtor.


Watanabe e o BiSH


E aí que Watanabe continua com o Alt Idol querendo uma reestruturação e reativação no BiS, é criado o BiSH e as histórias dos lançamentos com bizarrices e shows continuam (como por exemplo o show com apenas 13 vezes a mesma música). O BiSH deu certo, muito certo e até hoje continua lançando músicas e clipes, e com o BiSH dando certo Watanabe cria a Wack que serve como um guarda-chuva para as ideias dele e produção dele que abordarei em outro post.





O BiS retornou em 2016 com Pour Lui, lançou dois álbuns e Lui saiu em 2018 indo para o Billie Idle com o BiS sendo "desmembrado" em BiS1st e BiS2nd lançando exatamente as mesmas músicas com a diferença apenas na formação de cada grupo, e onde isso vai dar? Ninguém sabe, o que se sabe é que o BiS abriu essa porta pro desconhecido dentro de uma grande gravadora, mistura de sons, ironias, coisas que ninguém entende o porquê estão sendo feitas, mas estão, sem um padrão, sem ter em minha mente aquela linearidade de: "a banda é tal então ela vai tocar isto e fazer isso". Essa visão é colocada na nossa cabeça como sendo o certo, e quando o BiS surgiu com tudo aquilo faz repensar o quão limitante a algo pode ser, não só o idol, mas isso se reflete aqui no ocidente também, o pop lançando música pop, o punk lançando punk, e assim segue tudo padronizado, mas quando tudo isso é destruído dentro do próprio estilo, aí que tudo clarifica que não precisa e nem é saudável ser o mesmo, e esse é o movimento que o BiS criou.






Já que chegou até aqui tenho uma playlist colaborativa no Spotify com o que fui juntando lá de alt idol:

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